Velaí as primeiras palavras que um meu tio-avô, alô contra
o começo do século XX, ouviu no Brasil. Naqueles recuados tempos umha enchente
de galegos ia saindo do país cara o Brasil, pra além doutros destinos, e este
meu antergo foi um deles. Diz-que (segundo a mitologia da minha família) assi
que desembarcavam nalgum porto do Brasil, os colocavam todos no alto dum
estrado, pra os fazendeiros ou tratantes que for os irem escolhendo em funçom
do seu aspeto. E assi, meu tio-avô, sendo pequeno de estatura e mais de cabelo
ruço, foi «mercado» por alguém que gostou da sua pinta de galego bulideiro. Mas
se os galegos eram possivelmente «apreciados» no Brasil, polas suas dotes de
trabalhadores duros e sofridos, eles apresentavam tamém umha outra vantagem, a
respeito daqueles provenientes das outras partes da Europa e do mundo: é que os
galegos já falavam a língua do Brasil. Por isso mesmo é que eu ainda conheço o
significado desta palavrinha, «ruço», que embora hoje na Galícia esteja quase que
esquecida ou mesmo substituída por outras castelás («rubio, «castaño»), nos
tempos longes de que falo ainda estava viva. De facto, daquela, muitos dos
galegos que emigravam prà Argentina ou prà Venezuela, tinham que aprender umha
língua que eles nom falavam e nom deixava de lhes ser estranha: o espanhol. A
verdade é que há três ou quatro gerações a maioria dos galegos nunca falavam
espanhol, nem eram quem de o falar, tirado algumhas expressões aqui e acolâ,
necessárias nos eidos da escola, da igreja ou no trato coas autoridades
administrativas. Emporisso, o seu galego dava pra entender e, sobretudo, pra se
fazerem entender no Brasil.
Isto tem umha explicaçom mui doada: o português provem do
galego. E nom só: muitos dos emigrantes portugueses no Brasil originavam do
norte de Portugal, zona onde o substrato galego era ainda conservado nos
registos falados das persoas. E esses mesmos seus falares passárom a formar
parte do português do Brasil. Por isso, da mesma maneira que os galegos, os
trasmontanos e os minhotos se entendiam naqueles seus mui próximos falares, os
galegos no Brasil nom precisavam aprender umha outra língua, como decerto os
italianos, os espanhois, os alemães ou os japoneses precisavam fazer. Ou como
os próprios galegos tinham de fazer na Argentina, na Venezuela ou no Uruguay.
E cuido eu hoje que alô da outra banda, no Brasil,
meu tio avô, mesmo que tivesse sido «mercado» coma umha vaca loura na feira,
seica se sentia o seu próprio patrom ...
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